Pescadores do coletivo “Pescadores com Dignidade”, da região da baía de Guanabara, cobram da Petrobrás o pagamento de indenizações por prejuízos causados pelo vazamento de óleo ocorrido no ano 2000. Na ocasião, cerca de 1,3 milhão de litros óleo vazaram por conta do rompimento de um duto que ligava o terminal da Ilha D’água à Refinaria Duque de Caxias (REDUC).
Os pescadores foram recebidos nesta sexta (29/11) por uma representação jurídica da Petrobrás, na sede da empresa (EDISE), a qual informou que até o dia 30 dezembro irá pagar um valor ainda não definido a esses trabalhadores. A direção da Petrobrás tinha prometido uma solução para este sábado (30), mas em uma reunião com uma comissão de pescadores do coletivo anunciou o adiamento. Mais uma promessa ou cala boca?
São mais de 12 mil pescadores que tiveram suas vidas afetadas e que até hoje não tiveram seus danos ressarcidos. O coletivo “Pescadores com Dignidade” representa 9.877 pessoas.
Luta jurídica que se arrasta
Entre idas e vindas jurídicas, a Federação dos Pescadores do Estado do Rio (FEPERJ) ajuizou uma ação coletiva contra a Petrobrás, na qual pedia danos materiais, morais e lucro cessante por dez anos; tempo apontado para a recuperação do meio ambiente, o que foi reconhecido em primeira instancia pela Justiça, dando o direito à indenização a 12.180 pescadores e condenando a Petrobrás , em 2007 , a pagar cerca de R$1,23 bi. Mas a empresa recorreu em segunda instância , reconhecendo apenas o período a ser indenizado de 45 dias, tempo em que a pesca ficou suspensa na baía. Passados quase 20 anos, até hoje, a direção da Petrobrás questiona a legitimidade da FEPERJ e não efetiva esses pagamentos.
“A Petrobrás também alega para não pagar essas indenizações o fato de que a FEPERJ sobredimensionou o número de pessoas afetadas pelo vazamento, chegando a um número de 30 mil pescadores, quando na verdade existiam 12.879. A Justiça reconheceu esses dez anos, mas a Petrobrás questionou o número de afetados que foram dados na federação” – explica a advogada Elza Maimone , que trabalha em Pro Bono, para o bem público, sem cobrar honorários.
A situação ganhou mais um contorno quando a federação entrou com um pedido de execução provisória nos autos para o pagamento referente aos 45 dias e assim pagar finalmente aos pescadores, mas a Justiça não aceitou, pois entendeu que este seria um direito individual de cada pescador pedir esse pagamento, sem que isso fosse feito por um agente intermediário, no caso a FEPERJ. Por sua vez, a Petrobrás entrou com um agravo dizendo que faria o pagamento de forma individual desses 45 dias. Atualmente, o processo está aguardando análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que deverá ocorrer somente em 2020, sobre o mérito do período a ser pago, se de 10 anos ou 45 dias, e a legitimidade da FEPERJ para efetivar o pagamento aos pescadores. O Subprocurador Geral da República, Antonio Carlos Martins Soares , já se manifestou nos autos dando razão a FEPERJ.
Por sua vez, o coletivo “Pescadores com Dignidade”, através da advogada Elza Maimone , atravessou petição solicitando urgência de julgamento dado o inegável caráter alimentar da situação. O fato é que os pescadores querem receber suas respectivas indenizações da Petrobrás e não da FEPERJ. “Essa execução provisória diz respeito ao valor incontroverso de 45 dias. A diferença de 9 anos , 10 meses e 15 dias ainda está para ser julgada” – explica a advogada.
Os autos deste processo estão conclusos no gabinete do Relator Ministro Antonio Carlos Ferreira do STJ.
Pescadores querem justiça
E diante deste impasse, os pescadores formaram o coletivo “Pescadores com Dignidade” e realizam diversos atos, pressionando a direção da Petrobrás a efetivar os pagamentos. São quase dez mil pessoas que formam um coletivo que lutam contra o descaso das direções da Petrobrás durante esses quase 20 anos e a poluição da baía de Guanabara.
“Com esse vazamento perdi barco, rede e tudo. Desde o início desse processo a Petrobrás diz que vai pagar, mas até agora nada. E lá se vão quase 20 anos. O nosso coletivo agrega várias colônias de pescadores localizadas na Ilha do Governador, Ramos, Dique de Caxias, Magé. Várias pessoas já morreram, envelhecemos e não temos condição de trabalhar diante desta poluição da baía da Guanabara ” – conta Zaine dos Santos Coutinho.
Os pescadores que há tempos sofrem os efeitos do vazamento hoje passam por necessidades pelo fato de terem tido suas vidas afetadas pelo não pagamento de suas respectivas indenizações.
“ Há cinco dias os colegas pescadores me ajudaram a colocar uma cesta básica em casa porque eu não tinha nada para comer. Só queremos que nos paguem o que é nosso de direito. A gente não consegue nem receber o seguro defeso, não tem como pescar com tudo poluído” – disse Paulo, um pescador de Duque de Caxias.
Quem vive da pesca artesanal na baía de Guanabara…
Atualmente existem 10.879 pescadores artesanais da baía de Guanabara, que utilizam pequenas e médias embarcações motorizadas ou a remo, com redes de arrasto, cerco e espera, caniço e linha de mão. Apesar da precária forma de vida e trabalho e da limitação da pesca numa área que equivale a 15% do espelho d’ água, são responsáveis por 30% da produção pesqueira do estado do Rio de Janeiro.
O coletivo ainda denuncia a Petrobrás em sua página no Facebook – https://www.facebook.com/movimentopescadorcomdignidade/
Natal com dignidade
O coletivo “Pescador com Dignidade” pede doações de alimentos não perecíveis; medicamentos de primeiro socorro , roupas e brinquedos. Os postos de coleta para doações estão localizados nos seguintes endereços:
- Colônia Z10 – Rua Alexandre Rosa 5-A Sobrado ,Ilha do Governador –RJ, aos cuidados da Sra. Rita de Cassia (21)99921-3696;
- Colônia Z 11 – Av. Brasil 8.666, Ramos –RJ, aos cuidados do Sr. Santelmo (21)97538-2168 ou Sra. Rgina ;
- Associação dos Catadores de Caranguejo do Município de Magé, Rua dos Ferreiros 172 Suruí- Magé, aos cuidados da Sra. Marcia (21) 98453-9781 ou Sr. Rafael (21)98472-4569
A poluição que vem de longa data
O Sindipetro-RJ discorda totalmente do descaso das sucessivas direções da Petrobrás para com os pescadores afetados pelo vazamento do ano 2000, mas vale lembrar, no entanto, que mesmo antes deste acidente a baía de Guanabara já era poluída.
No seu entorno, há milhares de oficinas clandestinas e o esgoto doméstico é jogado in natura. Em 2017 estimou-se o volume de 15 mil litros de esgoto não tratado por segundo.
Além disso, os rios foram assoreados, ocorreu a ocupação desordenada das bacias hidrográficas e 16 municípios vivem em volta. O pouco caso de sucessivos governos que nunca investiram em saneamento básico e coleta e tratamento de lixo é patente, uma vez que nem as Olimpíadas do Rio conseguiram sucesso na despoluição da baía de Guanabara.
A triste situação da baía e dos pescadores é o reflexo do mal que o sistema de exploração capitalista gera para a coletividade inteira