Conflito de interesses na Petrobrás é tratado como um “mero detalhe”

Escolha de integrantes ao CA e Conselho Fiscal escancara que conflito de interesses na Petrobrás é desdenhado

No último dia 6 de agosto, conforme consta na ata n° 252, do Comitê de Pessoas (COPE), foi realizada uma reunião que foi convocada com o objetivo de avaliar, enquanto Comitê de Elegibilidade (CELEG) da Petrobrás, os novos membros para a alta administração e do Conselho Fiscal (Política de Indicação). Três nomes das listas apresentadas foram apontados em situação de conflito de interesses, mas, mesmo assim, foram levados para apreciação da Assembleia Geral (AGE).

Os casos

Os dois indicados pelo governo Bolsonaro, Márcio Andrade Weber , que até agosto de 2020 era diretor da Petroserv, fornecedora e operadora de sondas da Petrobrás, e Pedro Rodrigues Galvão de Medeiros, que até dezembro de 2020, então diretor do Citibank, banco responsável pela “abertura e subsequente pulverização do capital da BR Distribuidora”, incorreram nas restrições discriminadas na Lei Especial das Estatais (LEE) e na Lei das Sociedades Anônimas (LSA ), mas mesmo assim seus nomes foram levados à apreciação da assembleia geral.

Já, no levantamento, de Gildenora Batista Dantas Milhomem, que foi candidata a Conselheira Fiscal Suplente da Petrobrás, constava uma ressalva em sua avaliação que remete ao acompanhamento, pela área Jurídica competente na Petrobrás, de um processo em que era parte, mas que, por força do pedido de esclarecimentos do sindicato, se revelou de que se tratava de processo em que não era parte ré.

Ouça o áudio da contestação feita pelo diretor do Sindipetro-RJ/FNP, Vinícius Camargo na reunião.

 

 

Sindipetro-RJ denuncia a situação

Ao que parece, os comitês CELEG/COPE apresentaram ressalvas a alguns indicados ao CA, fato que deveria impedir a apresentação dos mesmos à votação na assembleia.

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Presente na assembleia, aproveitando sua condição de acionista, o diretor do Sindipetro-RJ, Vinícius Camargo, fez o alerta ao pedir a palavra na reunião.

“Devido aos apontamentos, o Sindipetro-RJ considera que os indicados/candidatos não estão à altura da Petrobrás. Ainda, dado o histórico recente de mais de 10 liminares (de diferentes temas) terem sido conquistadas pela Federação Nacional dos Petroleiros (FNP) e seus sindicatos filiados, dentre eles o Sindipetro-RJ, e proferidas pela justiça em favor dos trabalhadores, em face de medidas ilegais da Gestão da Petrobrás. Assim, como , do constrangimento devido a atuação do antigo Gerente Executivo de RH, Cláudio Costa que negociou ações em período proibido, sendo vinculado e homem de confiança do então presidente Roberto Castello Branco, deve se considerar como temerária a apreciação desses nomes pela assembleia, pois podem se somar à recém – postura de ilegalidades da direção” – protestou o dirigente do Sindipetro-RJ e da FNP.

Ainda, na AGE de 27/08/2021, o Sindicato se posicionou crítico à política destoante que a direção da empresa e do governo concede aos Conselhos e seus comitês, com aumento de efetivo e remuneração, enquanto corta efetivo, inclusive das áreas operacionais, e reduz a remuneração (não reposição da inflação de 2020) da categoria.

Confira as intervenções  do diretor Vinícius Camargo nos dois áudios seguintes:

 

 

 

 

Conflito de interesses de ex-executiva da empresa

Anelise Lara, até janeiro de 2021 , ocupava o cargo de gerente da venda de ativos da Petrobrás, quando se aposentou. No último mês de agosto assumiu o cargo de membro no conselho consultivo da Ipiranga.

A legislação é bastante frouxa, pois a situação não é considerada ilegal, quando se sabe que a antiga executiva da Petrobrás participou na execução de projetos estratégicos e relacionados à venda de ativos à concorrência na área de refino, gás e energia da Petrobrás.

Segundo a Lei de Responsabilidade das Estatais (Lei 13.303/16), que estabelece as novas regras para nomeação de diretores e conselheiros das empresas, após seis meses podem assumir cargos na iniciativa privada, como foi o caso de Anelise Lara. Mas fica evidente que com todo conhecimento adquirido em sua permanência na Petrobrás, certamente abrirá seu arsenal de informações que ajudarão seu novo patrão a se posicionar no mercado contra os interesses da Petrobrás.

O grupo Ultrapar é o controlador da Ipiranga, o mesmo grupo que tentou em 2019 comprar a Liquigás, sendo impedido pelo CADE, pois mais concentraria uma grande fatia no controle de venda de botijões de gás de cozinha. No momento, o grupo faz parte do oligopólio formado no setor, em que somente 4 empresas dominam 92% do mercado e têm massacrado a população com preços altos.

Recentemente, o mesmo grupo Ultra anunciou que desistiu da compra da Refinaria Alberto Pasqualini (REFAP) no Rio Grande do Sul. Teria sido uma dica da nova conselheira consultiva da Ipiranga?

Não é a primeira vez que Anelise Lara é envolvida com questões de conflito de interesses. Ainda , quando atuava na empresa, em 2019, recebeu um questionamento porque seu irmão, Ricardo Quintão Lara, é dono da Rilsan Engenharia, ligada à enrolada UTC, em leniência no processo por pagar propinas. Na ata 159, datada de 1º de março, do mesmo ano de 2019, ficou expresso que a executiva deveria se abster de votar e ou opinar em caso que envolvesse a empresa do irmão ou qualquer outra ligada a ele com contratos com a Petrobrás. Caso semelhante à amiga e também diretora Ana Lúcia Poças Zambelli – que na mesma reunião se disse sob suspeição para votar, por ter gerenciado empresas fornecedoras da Petrobrás.

E assim, a direção da Petrobrás toca seu tão decantado compliance, uma governança e conformidade corporativa que só é aplicada a funcionários de baixo e médio escalões , em detrimento dos reais interesses da empresa, deixando os chefões numa boa, acumulando informações confidenciais, privatizando o conhecimento acumulado de toda uma empresa, e sendo premiados por isso, podendo encher os bolsos na concorrência.

 

Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

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