Para que nunca mais aconteça, para que nunca mais se repita
Falar do golpe civil-militar de 1964 é tocar numa ferida que ainda não está cicatrizada na sociedade brasileira. Os expurgos, torturas, perseguições, assassinatos, desaparecimentos ainda seguem na memória do povo brasileiro, uma questão que segue não resolvida há 59 anos. É obviar que não há o que celebrar, apenas rememorar para que não aconteça mais, nunca mais.
O processo de anistia trouxe de volta quem teve que sair e abrir mão do sonho de um país melhor, mas trouxe à tona permissividade dos que ficaram impunes. Bolsonaro e seus perniciosos generais como Hamilton Mourão se orgulham de seus ídolos torturadores, e quiseram reimplantar esse modelo de dominação ao estado e ao povo brasileiro, mas perderam no voto. Porém, como dizia o dramaturgo alemão Bertolt Brecht, “a cadela do fascismo está sempre no cio”.
E podemos constatar isso no acampamentos que ficaram nos quarteis no pós eleições de 2022, em que milhares de seguidores de Bolsonaro não reconheciam a derrota e pediam golpe militar, movimento esse que teve seu ápice no dia 8 de janeiro, quando os prédios que compõem a Praça dos Três Poderes, foram atacados pelo bolsonarismo, a serviço do capital.
A grande lição que fica da história é que os trabalhadores não podem perder sua capacidade de luta e mobilização. A organização do movimento sindical é a conscientização das bases de uma categoria, junto com a solidariedade de classes. E ao longo dos anos, o movimento sindical aqui do Rio de Janeiro tem mostrado uma postura de vanguarda, sem esquecer de sua condição de classe trabalhadora.
A parte civil da ditadura: o empresariado
Oban
A Operação Bandeirante (Oban) foi criada para centralizar as investigações e o desmantelamento das organizações de esquerda – armadas ou não –, sob direção do Centro de Informações do Exército (CIE). O objetivo era dar mais eficiência à repressão, coordenando os diversos aparelhos policiais (militares e civis) e as Forças Armadas.
O projeto do general Canavarro Pereira foi financiado por grandes empresários de São Paulo e empresas multinacionais, com apoio da Federação das Indústrias (Fiesp). Há registros de contribuição financeira e apoio material por parte de bancos como o Bradesco e Mercantil de São Paulo, das automobilísticas Ford e GM, grupo Ultra (Ultragás), que se beneficiava da Petrobrás comandada pela ditadura de 1964, e a Folha de São Paulo, que emprestava carros de entrega de jornais para camuflagem dos agentes da Oban.
Volkswagem na berlinda
Após relatos e denúncias feitas à Comissão Nacional da Verdade (CNV) sobre a colaboração da montadora alemã Volkswagem com a ditadura civil-militar, trabalhadores de 10 centrais sindicais e outras organizações da sociedade civil, que formavam o coletivo Memória, Verdade, Justiça e Reparação, entraram, em setembro de 2015, com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) contra a empresa alemã.
Em setembro de 2020, esses inquéritos contra a Volkswagen resultaram no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), documento que firmava um acordo para recompor os danos causados às vítimas da repressão. Pelo TAC, A Volkswagen foi obrigada a pagar uma indenização de cerca de R$ 36 milhões, dos quais R$ 2 milhões foram destinados à pesquisa de dez empresas que também podem ter cooperado com o regime militar de alguma forma.
Ditadura atacou e interveio no Sindicato
A relação do golpe civil-militar de 1964 com a categoria petroleira e o Sindipetro-RJ é uma história de perseguições e intervenções. Logo em 1965, o Sindipetro-RJ sofre sua primeira intervenção militar, no ano seguinte é eleita uma chapa única apoiada abertamente pela ditadura.
Em 1968, os milicos anulam três eleições e por ordem do 1° Exército é decretada mais uma intervenção na entidade, eram tempos muito complicados.
Repressão dentro da Petrobrás
Logo após o golpe, os militares acreditavam que era um dever patriótico salvar a Petrobrás do domínio “comuno-sindicalista”. Segundo as pesquisadoras Luci Praun e Claudia Costa, que estudaram a repressão da ditadura na Petrobrás, essa justificativa foi usada para se montar uma vasta estrutura de vigilância, monitoramento e investigação dentro da estatal. O ponto inicial desse sistema foi a Comissão Geral de Investigação (CGI), fundada poucos dias depois do golpe com a intenção de promover uma limpeza da Petrobrás.
Comandada por um general, segundo apontam as duas investigadoras, a CGI levantou cerca de 3 mil suspeitos em pelo menos 1.500 processos de investigação. Entre abril e outubro de 1964, período em que a CGI funcionou, 516 trabalhadores da Petrobrás foram sumariamente demitidos como resultado de Inquéritos Policiais-Militares (IPM). Outros tantos tiveram contratos rescindidos, foram intimidados, transferidos de área ou sofreram sanções administrativas.
Posteriormente, dentro da empresa foi criada um dos principais órgãos repressivos na Petrobrás, a Divisão de Segurança de Informações, o DIVIN. A divisão era encarregada de fazer investigações políticas sobre empregados da estatal. Uma das principais atividades da DIVIN era a “Ficha de Controle da Investigação Político Social”.
Vários quadros da DIVIN pertenciam ao Exército e tinham sido cedidos à Petrobras. A maioria atuava no EDISE, o Edifício Sede da Petrobras, localizado na Carioca, no centro do Rio de Janeiro.
Em 2013, um levantamento feito pela Petrobrás em parceria com a Comissão Nacional da Verdade, identificou que o Serviço Nacional de Informação monitorou cerca de 26 mil prontuários de funcionários da empresa. Em nota, a Comissão informou na época: “O SNI monitorava movimentações de funcionários e aparentemente tinha poder de veto sobre promoções, caso encontrasse na ficha do funcionário algo considerado subversivo ou inapropriado ao regime militar”.
Não queremos mais golpes como de 1964, não queremos mais ditaduras, não queremos vetos!
Fonte Comissão Nacional da Verdade/Memorial da Democracia
Pistas sobre a estrutura e as ações de repressão do Estado brasileiro no pós 1964 e sua configuração no interior da Petrobras: Costa, Claudia e Praun, Luci.