No painel “Conjuntura nacional e geopolítica do petróleo”, os palestrantes convidados fizeram leitura dos primeiros seis meses do novo governo e indicaram limites e possibilidades para a luta da classe trabalhadora. Houve forte adesão dos congressistas, que lotaram o auditório principal do Hotel Windsor Florida, no Rio de Janeiro, e se inscreveram massivamente na rodada de intervenções para manifestar opinião e questionar os palestrantes
A mesa foi composta por Atnágoras Lopes, da executiva nacional da CSP-Conlutas; Sofia Manzano, economista, membro da direção do PCB e professora na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), e Sônia Meire, professora e vereadora de Aracaju (SE) pelo PSOL.
Atnágoras Lopes aponta limites da “conciliação de classes” em novo governo Lula
O dirigente da CSP-Conlutas criticou projetos do novo governo como o arcabouço fiscal e a reforma tributária, recém-aprovada, que não taxa, por exemplo, as grandes fortunas.
“Havia e ainda há no bolsonarismo uma vertente de uma parcela de militares, parcela do alto escalão, se alimentando e se retroalimentando de um projeto de fechamento do regime. Nós, da CSP-Conlutas, estamos muito felizes pelo projeto da ultradireita ter sido desalojado do poder central. Estamos muito felizes porque a tentativa de golpe no dia 8 de janeiro não vingou e a ampla maioria da CSP- Conlutas defende punição e prisão para quem participou dela e para quem a financiou”, disse.
“Agora, restabelecido o regime democrático burguês, não dá para haver meio termo em lutas, por exemplo, contra o arcabouço fiscal, contra o marco temporal. Sabemos ainda que a Petrobrás 100% estatal não faz parte do projeto do governo atual. É um olho no gato e outro no peixe”, afirmou Atnágoras.
O dirigente da CSP-Conlutas ainda criticou a cultura individualista do empreendedorismo e os governos fomentadores de tais práticas. “O maior problema estrutural de um governo de conciliação de classes é a desgraça do retrocesso da consciência de classe”, salientou.
Atnágoras criticou a posição das centrais sindicais, que estavam juntas até 31 de dezembro na luta pela revogação das reformas trabalhista e previdenciária, mas recuaram após a posse do novo governo.
“A CSP vê a conjuntura atual e busca resgatar o princípio da independência de classe. Governo é governo e sindicato é sindicato. Só enfrentando o governo haverá independência. Este governo é de conciliação com a direita, então é necessário enfrentar o desafio de organizar a luta nas ruas e com pautas concretas e objetivas: contra a reforma administrativa; o arcabouço fiscal; pela reestatização da Petrobrás; anulação e privatização da Eletrobrás; pela revogação das reformas trabalhista, da previdência e do novo ensino médio”, disse Atnágoras.
“E estaremos sempre juntos, em qualquer luta, contra o avanço da ultradireita no país”, concluiu o dirigente da executiva-nacional da CSP-Conlutas.
Sofia Manzano analisa aspectos econômicos do novo governo e influência do imperialismo
A professora universitária Sofia Manzano, do PCB, começou a palestra chamando atenção para a importância da categoria petroleira, uma vez essa está posicionada no setor estratégico de energia.
Como economista, ela ressaltou questões que estão por trás de movimentos como a conciliação de classes, que vai sendo empurrada goela abaixo, ou como a extrema direita fascista, que ganha a subjetividade de um setor da classe trabalhadora que a apoia. E muitos desses instrumentos estão relacionados à forma como os dados econômicos são apresentados.
“É assim como na Idade Média, quando toda a exploração da nobreza sobre a classe trabalhadora, naquele período, era justificada em nome de Deus. Só quem falava com Deus eram os padres, que rezavam a missa em latim e ninguém entendia nada. Mas acreditavam e não se sublevavam contra a dominação. A economia hoje é a nova missa em latim e 99% da população nada entende, mas acredita, porque os dados são apresentados como se fossem fatos”, disse.
“Um dos instrumentos ideológicos da ciência da própria economia é apresentar dados como se fossem fatos, quando eles são apenas uma visão dos acontecimentos gerais e não a sua totalidade. Portanto, são dados apresentados com objetivos políticos e ideológicos para levar a população a aceitar determinadas conjunturas”, explicou Sofia Manzano.
A professora e candidata à presidência da República em 2022 também comentou sobre o atual governo e as suas perspectivas para a área econômica.
“Nós estamos nesses primeiros seis meses de governo de conciliação Lula/Alckmin com indicadores conjunturais que parecem animadores, como a queda da inflação, as projeções positivas do PIB e do superávit da balança comercial, por exemplo. Então, parece que realmente é uma política que vai dar certo, mas são dados superficiais que escondem uma estrutura produtiva-econômica permanente de baixos salários, que vai se aprofundar ainda mais e que é nefasta para o país”, afirmou.
Sofia Manzano criticou a última distribuição de dividendos de R$ 25 bilhões feita pela Petrobrás já neste governo e a Reforma Tributária recém-aprovada, que não taxou esses dividendos. “Eles não pagam um centavo por essa renda!”, protestou.
Manzano também falou contra o domínio do agronegócio na economia e na política brasileiras, porque “é a favor desse agronegócio que as políticas econômicas estão sendo feitas”.
E ressaltou que as viagens de Lula são para trazer a influência do imperialismo ao Brasil: “Está sendo aprofundada a dependência externa. O Lula vai convencer o capital externo a vir aqui aumentar a exploração e isto se chama imperialismo!”
“Então, esse tipo de estrutura que se consolida no Brasil, de política do setor financeiro, do agronegócio e capital externo, não permite prever qualquer projeto de desenvolvimento, assim como não prevê o não retorno de um governo de ultradireita e fascista”, afirmou Manzano.
Sônia Meire defende foco no combate à ultradireita
A vereadora Sônia Meire (PSOL/Aracaju) iniciou sua intervenção destacando que não podemos desconectar o debate de conjuntura nacional da conjuntura internacional, principalmente no setor energético, que é dominado pela Índia, China e Estados Unidos. “Com todas as políticas governamentais que tivemos até agora, nós estamos cada vez mais entregando nossas matéria-prima”, destacou.
“A base da nossa estrutura é patriarcal, racista, e corresponde a uma política de submissão de uma raça sobre a outra. No período recente, nós tivemos o aprofundamento da exploração sobre população negra, periférica, indígena e de mulheres. Nós nos unimos e derrotamos Bolsonaro, mas não derrotamos o bolsonarismo. E, pela primeira vez na história, nós tivemos uma vitória eleitoral com uma diferença muito pequena de votos, portanto nós temos hoje um país fraturado”, analisou Sônia.
A vereadora de Aracaju também recordou que a direita bolsonarista elegeu governadores em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais e que, dos 27 chefes estaduais eleitos, 13 apoiaram Bolsonaro.
“A nossa vida está ameaçada a todo momento. A nossa situação é muito grave! Nós não tínhamos ilusão de que o governo Lula seria diferente, mas foi necessário [apoiarmos] para não termos uma derrota histórica. E não podemos abrir mão da nossa capacidade crítica. O PSOL, pela primeira vez, não apresentou candidato próprio à presidência, apresentou propostas para o programa de governo e temos independência de votação na Câmara Federal. Somos contra o arcabouço fiscal e continuaremos contrários a tudo o que é contra a base da classe trabalhadora”, afirmou.
“A luta de classes é diária em nosso país, mas precisamos ter força suficiente para reverter esse percentual de votos da última eleição e fazer a população entender quem é o seu maior inimigo. Se só atacarmos o governo Lula e não atacarmos nosso maior inimigo hoje, que é o interesse da força imperialista capitalista, nós poderemos ter uma derrota histórica daqui a três anos e meio. Nem ao adesismo cego às políticas do governo, nem o apoio sem a crítica, sem a unidade, sem o trabalho de base que precisa ser feito”, disse.
Sonia Meire ainda destacou que precisamos enfrentar diariamente a ultradireita conservadora, reacionária, sentindo a condição da base trabalhadora para avançarmos mais contra esse projeto de morte. “Que aqueles que atentam contra a nossa vida de diferentes formas sejam presos e sem anistia. Vamos continuar em luta!”, concluiu.