O Sindipetro-RJ está e esteve atuante no tema do complemento da RMNR em todas as instâncias do Judiciário onde o assunto foi e está sendo discutido. Entretanto, é preciso deixar as ilusões de lado e entender que o Judiciário, com o presente julgamento, cumpre seu papel institucional com a negativa e limitação de direitos aos trabalhadores. Nunca foi diferente e a história mostra isso
A 1ª Turma do STF retomou o julgamento iniciado em fevereiro de 2020 e suspenso pelo pedido de vistas da Rosa Weber e julga, entre os dias 23 e 30 de junho, seis agravos regimentais (grosso modo, são tipos de recurso) contra decisão monocrática de Alexandre de Moraes que “atendeu aos pleitos” presentes nos Recursos Extraordinários da Petrobras, BR Distribuidora, Transpetro afastando o acórdão obtido por maioria no TST em 2018 no Incidente de Recursos Repetitivos(IRR) n. 21900-13.2011.5.21.0012, sobre o tema do complemento da RMNR, favorável, na ocasião, aos trabalhadores, pelo trabalho dos sindicatos e advocacia particular. Tanto o Sindipetro-RJ, quanto outras entidades figuram como Amicus Curiae em tal processo individual que tem como autor o petroleiro José Maurício da Silva, patrocinado por seus advogados particulares. No dia 27.6.2023 houve o pedido de vistas do Dias Toffoli. O processo já tem maioria contrária aos trabalhadores, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Carmen Lúcia (3 votos) contra um voto da Rosa Weber. Luís Roberto Barroso se declarou suspeito e não vota.
As milhares de ações (de sindicatos e particulares) que estão suspensas no aguardo dos desdobramentos da ação individual referida visam a exclusão da base de cálculo do complemento da RMNR dos adicionais previstos em lei e, atualmente, encontram-se sobrestadas aguardando a finalização do julgamento no STF. O Sindipetro-RJ iniciou a distribuição das ações ainda em 2010, uma das primeiras coletivas a serem distribuídas no país.
Em seu voto, Rosa Weber, divergindo dos demais ministros, ressalta se tratar de uma questão infraconstitucional, tal como outrora já decidido pelo próprio STF em 2015 no tema 0795, em alinhamento à Súmula do STF 454 e 279, motivo pelo qual não se deveria reconhecer a repercussão geral e sequer serem admitidos Recursos Extraordinários sobre a matéria, levando à consolidação do decido outrora no TST em favor dos trabalhadores. Como afirmou o Sindipetro-RJ em 2018, quando soube da tentativa de recurso da Petrobras. Entretanto, diferente do outrora decidido, negou o relator, Alexandre de Moraes, sob o suposto fundamento de que a questão “ganhou enorme relevância econômica e social”, o referido precedente e a manteve sua decisão frente aos agravos que expunham, também, essa reivindicação. Ou seja, atendendo ao clamor da mídia que em cada momento divulga um impacto financeiro diferente sobre essa ação, ou às mentiras parciais das empresas que recorriam se dizendo “pobrezinhas”, sem qualquer estudo (qualquer estudo, fosse o valor da lesão causada pelo empregador irresponsável realmente fundamentada), numa canetada contrária aos trabalhadores, inclusive contra todo o consolidado no próprio tribunal, ataca de morte o direito dos trabalhadores petroleiros e, infelizmente, não só deles, pois reforça a insegurança jurídica sempre existente contra os trabalhadores.
Adentrando o mérito da questão, Rosa Weber ainda destaca sobre a posição do relator:
“Segundo Carlos Maximiliano, quando plurissignificativas as normas (mesmo convencionais), deve-se optar pela interpretação mais consentânea com a Constituição. A medida tem por escopo a segurança jurídica, a proporcionalidade e o respeito à autonomia negocial, porquanto se evita a supressão da norma (avoidance doctrine).
Renovadas as vênias, no caso, é equivocado afirmar que “ os critérios para o cálculo do valor do ‘Complemento da RMNR’ são isonômicos, razoáveis e proporcionais, haja vista que a quantia varia entre os empregados da empresa, dependendo do que cada um perceba como a Remuneração Mínima por Nível e Função a qual, por sua vez, considera o nível e o regime de trabalho do empregado”. A conclusão parte da equivocada premissa de que há isonomia em atribuir salários iguais, nos casos em que a Constituição impõe diferenciação”.
Reforça que a norma, se mantida, do ponto de vista material, fere o princípio constitucional da isonomia e da autodeterminação coletiva e que a decisão do TST está resguardada pela constituição no que tange aos princípios da proporcionalidade e respeito à autonomia negocial. Questionando, por fim, “se não há discriminação absurda em se remunerar igualmente trabalhadores sujeitos e não submetidos a risco de vida”, que é o que até o momento o STF está chancelando.
Histórico de desconstrução do direito do trabalhador
Não é de hoje que o STF (mas não só ele) trabalha na desconstrução da constituição que se diz guardião e, nela, do direto do trabalho. Tal decisão, se confirmada, em nada é diferente da história daquele tribunal e essa tese é comprovada e pública nas próprias decisões judiciais ao longo dos anos, encontrando um compilado explicativo no trabalho do jurista Grijalbo Fernandes Coutinho no livro intitulado “Justiça Política do Capital – A desconstrução do Direito do Trabalho por meio de decisões judiciais”, que ao analisar toda a jurisprudência do STF entre os anos de 2007 e 2020, “demostra, prova e comprova a destruição de conquistas históricas da classe trabalhadora e aniquilando seus direitos nas decisões da corte” e mostra como o STF está “atuando como protagonista de verdadeira guerra ideológica deflagrada contra os trabalhadores”, nas palavras da professora Daniela Muradas.
Àqueles que acreditam no judiciário, que hoje aplaudem ou vaiam os rebuscados ministros das altas cortes desse poder que nos ataca diuturnamente, sugerimos a leitura da obra acima.
Estamos sendo atacados em todos os planos dos poderes, desde sempre. A ilusão com o judiciário e o arrefecimento das mobilizações em prol de supostas conciliações está paulatinamente destruindo conquistas históricas dos trabalhadores, de conjunto, não só dos petroleiros; direitos históricos, não só temporalmente localizados.
Mas é importante dizer que o sindicatos tem atuado e, mesmo sem grandes ilusões com o que é o judiciário e vendo a limitação que uma pauta de lutas entregue ao judiciário com ausência de mobilização gera, estamos trabalhando para mostrar as contradições e as limitações, sempre com o intuito de mobilizar, de agir e não de esperar que façam por nós.
Histórico da atuação do Sindipetro-RJ
O Sindipetro-RJ está acompanhando o julgamento e fazendo as diligências necessárias, mas encontra (assim como outras entidades) limitação de atuação no processo paradigma, como dito, um processo individual não patrocinado pela entidade no qual estamos como amicus curiae que não tem possibilidade recursal, como afirmado, entre outros, no voto da Rosa Weber.
Temos uma advogada cativa em Brasília para esse momento, desde o dia 26.5.2023, para acompanhar, entre outras, a referida demanda. Algo necessário para as diversas demandas que temos quotidianamente nos planos individuais e coletivos que mostram o quanto as empresas atacam e (se sentem livres para tal) os direitos existentes, numa tensão constante e de descumprimento contínuo.
Importante registrar que estivemos e estamos em todas as instâncias e locais que se fizeram necessário no âmbito judicial desde a distribuição das primeiras ações em 2010, até agora, atuação que, registre-se, foi coroada com uma vitória no TST por maioria, estávamos lá, presentes, fosse na audiência pública, fosse na interlocução com os ministros. Muitas vezes, um trabalho que não aparece, mas que é feito com muita responsabilidade, mesmo entendendo o terreno no qual estamos pisando.
Justiça seja feita, não somente nós estivemos e estamos presentes e atuantes, como outros diversos sindicatos e federações, no que pese as diferenças de entendimentos em outros planos, estamos todos convergentes nesse tema e atuantes, agindo não só na esfera do judiciário, mas também nos outros poderes, cada um com suas particularidades de atuação.
O que se projeta, reiteramos, não é algo fora do esperado, são os vassalos da classe dominante que mandam nesse país, mais uma vez, impondo a sua ideologia que também é a dos seus senhores.
O STF não respeita o direito do trabalho que dirá respeite a classe trabalhadora e reafirmam isso mais uma vez.
A falácia – um julgamento baseado na mídia hegemônica
A mídia hegemônica sempre cita os julgamentos sobre esse assunto como uma ação bilionária, a cada momento um valor é citado, no início R$ 10 bilhões e, atualmente, se fala em até R$ 47 bilhões… Essas cifras são altas para, por exemplo, a Petrobras?
Desmistificamos isso em estudo levado aos ministros, relativizando esse valor em relação ao que é a Petrobras, quando, de má-fé, os advogados da companhia levaram aos ministros recortes de situações pontuais da categoria querendo fazer crer que os petroleiros eram detentores de salários, por vezes, superiores à R$ 100 mil… Como se isso fosse regra e não situação absolutamente específica e, via de regra, como no caso que a empresa trouxe – para confundir os ministros ou os apoiar em suas ideologias – que o referido contracheque somava ao salário, recebimento de ação judicial que o seu destinatário obteve naquele mês.
Os ministros não são ignorantes aos números da Petrobras, por exemplo, nos últimos anos. E, não são ignorantes às práticas atentatórias das empresas contra os trabalhadores. Em 2019, por exemplo, só a Petrobras lucrou mais de R$ 40 bilhões e, não bastou para que mentisse e chorasse miséria para tentar aplicar ilegalmente legislação com redução de salário dos trabalhadores no início de 2020, no seu famigerado e atentatório plano de resiliência que viu na pandemia, que se seguiu, verdadeira oportunidade. No ano de 2021 a Petrobras teve de lucro líquido aproximadamente R$ 107 bilhões, em 2022 R$ 188 bilhões, ou seja, só de lucro liquido nos últimos 2 anos estamos falando de uma empresa que lucrou aproximadamente R$ 295 bilhões de reais, ou seja, em média, aproximadamente R$ 147,5 bilhões de lucro líquido por ano.
Vamos supor que o valor de retorno aos trabalhadores a partir do que eles foram lesados seja R$ 50 bilhões, isso chega a um terço do valor médio, como demonstrado acima, de um ano do lucro médio citado, mas em quanto tempo esse valor e lesão foi gerado? No mínimo desde 2007, logo estamos falando de um valor que se distribui e foi constituído em 15 anos; estamos falando de um valor médio de R$ 3,3 bilhões por ano… Isso a mídia hegemônica não diz e a parcialidade da avaliação tampouco fala. O crédito trabalhista é um dos mais baratos existentes (graças, também, ao STF), o que faz que esse valor já seja menor do que o valor efetivo que deveria ter sido pago na ocasião, considerando a inflação. Considerando R$ 50 bilhões convertidos para o dólar, na data de hoje, estamos falando de, aproximadamente, 10.5 bilhões de dólares. Isso é um valor muito grande para uma empresa igual a Petrobrás quitar?
Lembremos o que ocorreu na “class action” no judiciário estadunidense, em 2018 (ano que o lucro líquido atingiu cerca de 26 bilhões de reais), quando a Petrobras pagou cerca de 3 bilhões de dólares (cerca de R$ 10 bilhões em cotação da ocasião), em três parcelas no prazo de um ano aos estadunidenses, que tiveram garantidos seus investimentos no idolatrado mercado do qual a empresa é vassala. Dinheiro do nosso povo, do botijão de gás, dos combustíveis que aumentou, da inflação que subiu… (https://petrobras.com.br/fatos-e-dados/assinamos-acordo-para-encerrar-class-action-nos-eua.htm#:~:text=No%20acordo%20proposto%20para%20o,tem%20prazo%20legal%20pr%C3%A9%2Ddefinido.)
Não vimos a mídia hegemônica falando do absurdo desse pagamento, de que não deveria pagar porque é um valor muito alto ou coisa do gênero, ou mesmo os absurdos que a empresa iria quebrar por isso, como fazem crer em relação ao que é devido aos trabalhadores.
A conclusão pode ser tirada de outro caso paradigmático, os assassinatos cometidos com a tragédia ambiental de Brumadinho, no qual a BHP e Vale, por meio de sua face comum, a Samarco, mataram 272 pessoas e devastaram significativamente o meio ambiente, nos processos que se seguiram (e seguem) vimos a consolidação da injustiça e, mais uma vez, ao que se presta o judiciário. Em sua petição inicial, o MPF – ao comparar com outra tragédia causada pela BP, no Golfo do México – justificou a multa a ser imposta pelos danos causados no caso de Brumadinho, um valor sem precedentes, para uma tragédia sem precedentes, uma vez que, não haveria de se pensar que um milímetro do nosso território e de nossas vidas valessem menos que os respectivos território e vidas estadunidenses, na avaliação do procurador… 4 anos depois, aparentemente a conclusão é contrária: nossas vidas valem menos, nosso territorio vale menos para os poderes.
Voltando ao nosso caso, o poder judiciário, por meio do STF, corrobora isso, mais uma vez, pela decisão, se confirmada, o valor absoluto da lesão justifica a anistia da “agressão” ao direito, independente da capacidade do “agressor”.
O que fazer?
A consciência desses casos deve ser acumulada para massacrar qualquer ilusão que a classe trabalhadora tenha com o que está aí e que de fato venhamos a nos mobilizar para, de fato, lutar. A solução está na luta, não na tecnocracia parcial a serviço de quem nos ataca.
Nesse sentido, o movimento é essencial, se movimentar é essencial, então, minimamente, façam aqueles que estão com a caneta nas mãos sentirem o que a categoria deveria com força estar impondo, se manifestem nos congressos da categoria que estão acontecendo pelo país, mandem mensagens, expressem o que essa decisão representa para quem está expondo sua vida enquanto togados sentam confortavelmente e rasgam, sem a menor cerimônia, direitos históricos nossos, enquanto legislam em interesse próprio. É preciso dar rumo à indignação.
Comecem com simples emails de dois dos ministros que julgaram contra nós: gabcarmen@stf.jus.br; gabmtoffoli@stf.jus.br, enviando o conteúdo dessa matéria ou se manifestando livremente para esses e outros que nos atacam.
Moção aprovada no Congresso do Sindipetro-RJ 2023: MOÇÃO DE REPÚDIO AO STF
“Messias, Deus, chefes supremos,
Nada esperamos de nenhum!
Sejamos nós que conquistemos
A terra mãe livre e comum!
Para não ter protestos vãos,
Para sair deste antro estreito,
Façamos nós por nossas mãos,
Tudo que a nós nos diz respeito”
(Trecho do hino – A Internacional)