9 anos da morte do operador Rodrigo Antônio: memória e luta

Neste dia 22 de fevereiro, completam-se 9 anos da morte do Rodrigo Antônio de Oliveira, que trabalhava como operador na Usina Termelétrica Barbosa Lima Sobrinho-Baixada Fluminense (UTE-BLS/BF), em Seropédica. Sua morte, em 2015, ocorreu 11 dias após um “acidente” numa caldeira do complexo industrial, mais precisamente na parte nomeada Baixada Fluminense (BF).

O operador foi atingido por condensado (líquido formado quando o vapor passa do estado gasoso pro líquido), tendo mais de 70% do corpo queimado. O socorro demorou, o que piorou ainda mais a já terrível situação dele e depois ele agonizou em dois hospitais nesse período. Morrer em decorrência de queimaduras é um dos tipos de morte geralmente considerados mais sofridos.

De modo muito resumido, o “acidente” se deveu a fatores físicos, como material de menor qualidade pra tubulações (a transnacional sueca Skanska, que construiu a usina, buscou material mais barato na lógica de maximizar o lucro, e a Petrobrás acabou aceitando um material de menor qualidade), o que facilitou a corrosão de trechos da tubulação e seu entupimento, e a fatores ligados à forma da hierarquia organizar o trabalho (nessa parte, estão incluídos, entre outros problemas, a pressão por um produção a toque de caixa na época e um efetivo reduzido – problema que se agravou muito desde então).

A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa) local havia alertado sobre problemas na tubulação que levava à caldeira onde ocorreu o “acidente”, mas a empresa não tomou medidas concretas pra resolver o problema.

Um agravante é que, com a drástica redução do efetivo que o sindicato vem combatendo desde o início, os riscos aumentam não “apenas” com a sobrecarga de trabalho, afetando desde o físico e o psicológico dos trabalhadores até a análise de riscos na elaboração de permissões de trabalho (PTs), mas também a probabilidade de um operador subir sozinho nas caldeiras, já que não é incomum que fiquem apenas dois operadores num turno numa das duas usinas do complexo termelétrico e que um tem que ficar no painel.

O Sindicato é contra que um operador suba sozinho numa caldeira e a empresa disse, após o “acidente” fatal, que adotaria como prática esse tipo de serviço nunca ser realizado por alguém sozinho, mas, de acordo com relatos, não é o que a empresa pratica no cotidiano.

O operador Alexandre Leal reforça o aumento do risco representado pela sobrecarga de trabalho devido à redução do efetivo. “Um aspecto do problema que também precisa ser levado em consideração é que hoje não existe um limite de PTs por operador. Pra além de dificultar muito a análise pormenorizada dos riscos, torna praticamente impossível o acompanhamento no local de cada serviço. Porque não basta emitir a PT. É necessário também acompanhar de perto a realização do serviço em questão. E essa está longe de ser a única atividade de um operador.”

Alexandre Leal ressalta que o Rodrigo Antônio era um excelente profissional, que, mesmo com muita experiência, estava sempre lendo materiais sobre os equipamentos da usina, manuais de turbinas, procedimentos operacionais da usina… Essas falas refletem o pensamento pelo menos da imensa maioria dos operadores da UTE-BLS/BF, de acordo com uma enquete realizada pelo sindicato em 2020, citada numa matéria que divulgamos no ano passado

Rodrigo Antonio: 8 anos de sofrimento por causa de uma morte evitável

Escrevemos a palavra acidente entre aspas pra ressaltar que poderia ter sido concretamente evitado, já que o senso comum entende acidente como uma ocorrência (quase) inevitável.

Apresentamos, a seguir, uma parte do histórico de matérias que publicamos sobre a morte do Rodrigo Antônio.

Morte do operador Rodrigo Antônio completa sete anos

UTE-BLS/BF: seis anos de uma morte que poderia ser evitada

A redução do efetivo é um fator de risco

Ao longo dessas matérias, apresentamos de forma mais detalhada o “acidente” que vitimou o Rodrigo Antonio e algumas lições que precisamos tirar desse trágico acontecimento. Eis também um vídeo que realizamos com trabalhadores da UTE-BLS/BF há 6 anos ressaltando que a redução do efetivo tende a aumentar o risco de acidentes e adoecimentos:

A família do Rodrigo Antônio, com a qual mantemos contato, continua grata a todos os que mantêm a memória em torno dele e que fazem dessa memória parte da luta pra que nunca mais aconteça, com ninguém, o que aconteceu com ele. Dessa forma, a família dele continua grata a todos os que lutam por segurança e saúde no trabalho. O direito de ir e voltar do trabalho vivo e saudável é um direito básico, mas, infelizmente, ainda muito desrespeitado.

Numa atividade que realizamos há 5 anos na porta da UTE-BLS/BF, o diretor do sindicato Antony Devalle leu uma carta da família do Rodrigo Antônio:

Atualmente, está no catálogo de um dos serviços online de streaming pagos uma série sobre a explosão do ônibus espacial Challenger, em 1986, em uma plataforma de lançamento da Nasa, nos EUA, que vitimou todos os que nele estavam. Nessa série, que é de estilo documentário, é mostrado que, mesmo sabendo formalmente dos riscos acentuados de decolar com temperaturas frias, os hierarcas da missão decidiram que a Challenger decolaria.

Dito de forma muito resumida, o resultado da investigação com a participação do Richard Feynman, vencedor do prêmio Nobel de física, apontou pro problema que já havia sido assinalado antes da decolagem: que o material dos anéis de vedação dos foguetes propulsores era sensível ao frio, ficando rígido demais e quebradiço em baixas temperaturas.

A temperatura no local e no dia do lançamento estava baixa e congelou partes na nave, inclusive as áreas de vedação. O problema no material de um dos anéis de vedação do foguete propulsor deixou escapar combustível e causou a explosão. Como de costume, interesses econômicos e políticos guiaram decisões que acabaram levando a mortes.

Guardadas as diferenças significativas, esse é um dos fios condutores principais entre o “acidente” da Challenger e do Rodrigo Antônio.

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