Plataformas de antecipação de recebíveis, a financeirização da cadeia produtiva da Petrobrás

Programas da companhia, em tese, deveriam reforçar o capital de giro de prestadores de bens e serviços, mas acabam por criar uma “agiotagem” no sistema Petrobrás, em muitos casos afetando a vida de trabalhadores terceirizados

Na Petrobrás, a princípio, conseguimos identificar dois programas que permitem aos seus fornecedores, a antecipação de recebimento de faturas de contratos com a companhia, tendo como garantia os contratos assinados com a estatal.

Assim, as empresas terceirizadas recebem uma antecipação de agentes financeiros, embolsando valores de contratos acertados com a Petrobrás, via bancos, para depois receberem os valores das medições contratuais, mas muitas, apesar de anteciparem seus recebíveis, ficam em dívida com os seus trabalhadores.

Programas “Progredir” e “Mais Valor”

O Portal Progredir é uma ferramenta eletrônica idealizada pela Petrobrás com o apoio do PROMINP (Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural) . Este Portal foi desenvolvido para viabilizar o Programa Progredir, que tem como principal objetivo ampliar o acesso a crédito e possibilitar o crescimento sustentável da Cadeia de Fornecedores da Petrobrás.

Através deste Portal, os fornecedores cadastrados que seguirem os requisitos do Programa (ter um contrato com empresa do Grupo Petrobrás) poderão solicitar financiamento aos bancos participantes.

Integram o Progredir, o Banco do Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Itaú, HSBC, Santander, BicBanco, Banrisul, Citibank e Safra. Em 2018, houve licitação e a transação passou a ser feita no ambiente de tecnologia Finanfor da iDtrust Tecnologia de Software Ltda., sediada em Ribeirão Preto no interior de São Paulo.

Para quem não sabe, a ex-esposa do atual presidente da Petrobrás Caio Paes de Andrade, a estadunidense Margot Greenman, atualmente é sócia da Captalys Companhia de Crédito, empresa que fundou em 2016. Em 2020 – no mesmo ano da separação do casal – a Capitalys comprou quase 90% da iDtrust. Ou seja, a ex-esposa de Caio Andrade é sócia de uma empresa que presta serviço para a Petrobrás, através do programa Progredir, mostrando, que de fato, há uma situação que envolve um possível conflito de interesse, coisa que o Conselho de Administração da Petrobrás não quis enxergar, mas essa é outra história…

Leia mais em https://sindipetro.org.br/paes-andrade-na-berlinda/

Já o “Mais Valor” é um programa lançado pela Petrobrás em dezembro de 2020 para reforçar o capital de giro da cadeia fornecedora. Em 2021, o programa atingiu a marca de R$ 9 bilhões em operações realizadas no primeiro ano de vigência, segundo informe da empresa em dezembro de 2021. A plataforma de soluções financeiras permite que os prestadores de bens e serviços possam antecipar o recebimento de faturas de contratos com a Petrobrás e as suas empresas da holding.

Segundo a Petrobrás, somente no “Mais Valor”, no mesmo período, mais de 55 mil faturas foram antecipadas e 1,7 mil fornecedores foram cadastrados e habilitados no programa. O objetivo é aliviar o fluxo de caixa de curto prazo dos supridores.

O “Mais Valor” é uma ferramenta digital que utiliza a plataforma de uma startup parceira, a Monkey. Conforme uma reportagem do Valor Econômico, pelas regras do programa, o fornecedor cadastrado recebe um e-mail sempre que tem faturas disponíveis para antecipação e que as transações ocorrem por meio de um leilão reverso, vencido pela instituição financeira que fizer o lance com a menor taxa de juros. Segundo a estatal, o mecanismo “resulta em taxas de desconto mais atrativas para os fornecedores”.

Segundo a reportagem do Valor, o recurso mínimo das faturas a serem adiantadas é de R$ 1 mil e não há valor máximo previsto. Empresas de qualquer porte podem aderir ao programa e que não há qualquer limitação de nicho, desde que a empresa seja fornecedora direta da Petrobrás.

Grande parte dos contratos é de empresas médias

Para dimensionar o tamanho da cadeia fornecedora Petrobrás, a petroleira fechou, em 2020, contratos com 14,7 mil fornecedores, no valor total de R$ 257 bilhões – incluindo nessa conta a Transpetro e a Petrobras Biocombustível (PBIO). A maior parte desses acordos é composta por pequenos negócios.

Ao todo, 70,8% dos fornecedores da Petrobrás controladora celebraram negócios de até R$ 100 mil. O percentual de supridores com negócios acima de R$ 100 milhões, com a petroleira, é de cerca de 1%.

Enquanto isso terceirizados sofrem com atrasos de salários

Se por um lado, a cadeia de fornecedores possui mecanismos que facilitam antecipações de recebíveis com a lógica de uma manutenção de saúde financeira, essa mesma proteção não acaba ocorrendo para os trabalhadores dessas empresas que sofrem de forma contumaz com atrasos de salários, benefícios como vale transporte e vale refeição, além de calote em indenizações após distrato em contratos de trabalho. Exemplo disso não faltam. Fornecedores e prestadores de serviços como WM Manutenções, PAS Brasil, LDM, Profmont entre outras empresas com contratos com a Petrobrás são recorrentes em atrasos com suas obrigações junto aos seus trabalhadores.

O fato é que o ônus da financeirização da cadeia produtiva da Petrobrás, pelo jeito, está recaindo contra os trabalhadores terceirizados que ficam “a ver navios”, enquanto o sistema financeiro e especulativo do país se torna um sanguessuga da Petrobrás.

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