Programa Faixa Livre completa 25 anos no ar

Reprodução Programa Faixa Livre

A defesa da soberania nacional, dos direitos dos trabalhadores, de uma democracia plena e de uma sociedade justa. Esses preceitos basearam a fundação do Programa Faixa Livre, no dia 5 de dezembro de 1994, pela iniciativa de um conjunto de entidades sindicais, associativas e conselhos profissionais que visavam criar um contraponto ao projeto neoliberal que se desenhava com a chegada de Fernando Henrique ao poder.

Passados 25 anos, nossa trincheira radiofônica, apesar das inúmeras dificuldades nesta trajetória, reafirma diariamente seu compromisso com o povo brasileiro e sua responsabilidade em manter um canal aberto para o diálogo democrático, dando voz àqueles que não se vêem representado pela mídia dominante.

Para debater e comemorar o Jubileu de Prata do Faixa Livre, convidamos personagens que simbolizam todos os que proporcionam a nossa veiculação diária. Em nome dos patrocinadores, o diretor da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet) Fernando Siqueira, entidade que participou da fundação do programa, e o presidente da Associação de Funcionários do BNDES Arthur Koblitz.

O historiador e dirigente do Partido Comunista Brasileiro (PCB) Heitor Oliveira representou a professora da UFRJ Zuleide Faria de Melo, idealizadora da iniciativa, e a Fundação Dinarco Reis, contribuinte do Faixa. Simbolizando os ouvintes, o economista e especialista em segurança pública José Victor dos Santos esteve nos estúdios.

Veiculado pela rádio Bandeirantes 1360AM, ex-rádio Guanabara, e comandado pelos jornalistas Ricardo Bueno e Álvaro Queiroz, o programa foi criado com o objetivo de tratar dos temas importantes da pauta nacional a partir de um viés progressista, com a participação de especialistas e os comentários de sua audiência.

“Lembro que, na época, existia um programa na antiga rádio JB AM 940, que era apresentado pelo [jornalista] Eliakim Araújo, o ‘Encontros com a imprensa’, e havia também outro jornalista já falecido, o Carlos Chagas. Passando pelo dial, descobri o Faixa Livre na antiga rádio Guanabara. O único problema da rádio Guanabara eram os transmissores de antena, às vezes a gente não conseguia ouvir pelo ruído das interferências. O Ricardo e o Álvaro Queiroz foram sempre muito combativos, principalmente o Ricardo Bueno, muito corajoso nas suas opiniões e lúcido nos seus comentários”, lembrou José Victor.

A Aepet teve papel fundamental no desafio de ajudar a levar ao ar uma tribuna que se opunha à lógica estabelecida pelas urnas, com a presença de estudiosos e lideranças do quadro político nacional vocacionados à defesa de um projeto de nação que atendesse às necessidades da maioria da população.

“A Zuleide nos procurou apavorada, em 1994, com a eleição de Fernando Henrique, que sabíamos que seria um entreguista de altíssima competência. O Faixa Livre seria uma resistência à devastação que ele realmente causou, depois fazendo a mudança da ordem econômica, acabando com o monopólio do petróleo, das telecomunicações, vendendo a Vale. A criação do Faixa Livre tinha a intenção de disseminar essa ideia pelo Brasil todo, a resistência ao governo Fernando Henrique”, explicou.

À época mandatário da entidade petroleira, Fernando Siqueira lembrou os ataques à democracia brasileira e destacou a ascensão do peessedebista, ex-ministro da Fazenda de Itamar Franco, à Presidência como mote para o surgimento do programa.

Em sua história, o Faixa Livre fez questão de manter seu caráter crítico diante dos desmandos promovidos pelas diferentes gestões da administração pública, independentemente de sua orientação ideológica.

Tal postura acabou por produzir dissidências de algumas das entidades colaboradoras ao longo do tempo, especialmente durante os governos do PT, mas manteve o maior patrimônio do programa: a confiança de seus ouvintes, carentes de uma tribuna que denunciasse as iniciativas governamentais contrárias aos interesses dos trabalhadores.

“É bom celebrar o aniversário do Faixa Livre primeiro porque mostra visões diferentes da chamada esquerda nacionalista. É isso que o programa tem de ser, fugir dessa segmentação da esquerda.  Não acho que é necessariamente ruim a esquerda no Brasil tentar se dividir, e o programa consegue sobreviver nessa onda promovendo o diálogo entre as perspectivas. O programa é antineoliberal nas raízes, mas ele tem de ser amplo, aberto para o debate da esquerda”, avaliou Koblitz.

Apesar das adversidades impostas tanto financeiras, como políticas, o programa manteve-se no ar e, desafiando a lógica, ampliou seu alcance, chegando às redes sociais, inaugurando um site próprio e disponibilizando seu conteúdo através da transmissão pela internet, ao vivo, via aplicativo e no formato podcast, para que o ouvinte acesse a hora que quiser as entrevistas.

A tarefa do Faixa Livre de revelar as entranhas da política se recrudesceu após o processo irregular de impeachment de Dilma Rousseff, patrocinado pelos detentores do grande capital, e a chegada ao Palácio do Planalto do ex-capitão do Exército, eleito sob influência do fenômeno das notícias falsas.

“O governo Bolsonaro é um expoente desse novo conglomerado político que se formou, atraindo setores neopentecostais, conservadores e reacionários, uma aliança entre conservadorismo e reacionarismo muito forte que estabelece uma aliança sob a pauta comportamental, mas recheada de ofertas financeiras para atrair o setor do fundamentalismo religioso e, nos grandes centros urbanos, as milícias, que não são apenas um braço armado, mas também garantidoras da continuidade desse esquema político”, denunciou Oliveira.

A retórica autoritária de Bolsonaro e de sua equipe de governo oferece aos que disputam o protagonismo político um novo horizonte: conservar a democracia no Brasil, ainda que errática, e conter o avanço de medidas que visam entregar o Estado nacional.

“Tem gente trabalhando para se fazer uma ditadura no Brasil, não tenho a menor dúvida disso. Esse Paulo Guedes fica toda hora tentando se desculpar, dizendo que escapou, ele já falou que funcionário público que tem partido é militante, não pode ter estabilidade, já falou do AI-5. Ele não se contém. Temos de nos contrapor a isso, dizer que ainda há muito espaço democrático no Brasil, precisamos nos organizar, cuidar de fazer uma reflexão de como estamos tentando fazer, o que aconteceu com a esquerda no Brasil nos últimos anos”, avaliou o presidente da AFBNDES.

O panorama de desmonte das estruturas nacionais não elimina a confiança de que haja modificação do quadro, pelo menos para o dirigente da Aepet.

“Sou otimista. Acho que quando a coisa está muito ruim, ela está perto de melhorar. Estamos em um fundo de poço, temos várias incoerências no domínio do nosso governo. O Bolsonaro é apoiado pelas igrejas pentecostais que se baseiam no ensinamento de Jesus Cristo, e Jesus Cristo pegava o amor, a fraternidade entre irmãos, e esse governo prega o assassinato, armas. A minha esperança é que tudo isso que está acontecendo de ruim venha a esclarecer as pessoas para que elas tomem iniciativa”, profetizou.

Já o historiador destacou a necessidade de as Fundações dos partidos de esquerda seguirem o exemplo da Dinarco Reis, que representa o PCB, e auxiliarem na manutenção do programa Faixa Livre no ar.

“As fundações dos partidos recebem suporte de recursos públicos, A Fundação Dinarco Reis não recebe mais, a reforma eleitoral cortou o financiamento de partidos que não atingiram a cláusula de barreira, mas, mesmo assim, consideramos um dever militante a contribuição ao Faixa Livre. As fundações devem estar presentes”, considerou.

Ainda que a realidade se imponha, a trincheira radiofônica segue com a proposta de sua fundação. O apresentador Paulo Passarinho, aliás, propôs um objetivo ousado: chegar ao Jubileu de Ouro, em 2044.

“A faixa é livre, aqui se respeita o contraditório, se aceita sem maiores problemas divergências por um motivo muito simples: quando todo mundo pensa igual é porque ninguém está pensando. O Faixa Livre pode ser um belo exemplo de irradiação de um pensamento crítico ao modelo único que se tenta impingir mundo afora e, quem sabe, a gente consiga, talvez em outra situação, propagar isso”, decretou José Victor.

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