No dia 22 de fevereiro de 2015, o operador Rodrigo Antonio de Oliveira morreu, após lutar bravamente pela vida desde que teve mais de 70% do corpo queimado por condensado (líquido formado quando o vapor passa do estado gasoso pro líquido) de uma caldeira da Usina Termelétrica Baixada Fluminense, uma das duas usinas que compõem o complexo Usina Termelétrica Barbosa Lima Sobrinho/Baixada Fluminense (UTE-BLS/BF) no dia 11 de fevereiro daquele ano
O número 8, quando colocado na horizontal, vira o símbolo do infinito. Nestes 8 anos da morte do Rodrigo Antonio, relembramos, como fazemos a cada ano, que a dor da família dele é infinita. Por mais que o tempo ajude a cicatrizar e por mais que, até em memória do ente querido, se transforme a dor mais aguda numa serena lembrança inesquecível, a cicatriz sempre lembra que, especialmente num caso como o do Rodrigo, a realidade poderia ser diferente, que não é diferente porque decisões nem sempre são tomadas tendo como base o bem comum e a valorização da vida.
Relembrarmos a morte do Rodrigo e o acidente que acabou vitimando-o é parte da importante vigilância pra que nunca mais um trabalhador padeça em situação semelhante na usina.
Costumamos escrever acidente entre aspas quando falamos sobre o que ocorreu com o Rodrigo Antonio. Porque acidente, sem aspas, dá a impressão, pelo menos no senso comum ou numa leitura rápida, de que foi obra do mero acaso, de que nada poderia ter sido feito pra evitar a ocorrência ou, se algo pudesse ter sido feito, teria sido de responsabilidade (implicitamente exclusiva ou quase) da vítima.
Aliás, segundo relatos da própria família do Rodrigo, hierarcas da empresa tentaram jogar a culpa do acidente na vítima. Como explicamos um pouco no ano passado (https://sindipetro.org.br/7-anos-sem-rodrigo-antonio/ ) e em outros anos (por exemplo: https://sindipetro.org.br/a-memoria-do-rodrigo-antonio-em-meio-a-duas-datas-fundamentais/ ;
https://sindipetro.org.br/ute-bls-bf-seis-anos-de-uma-morte-que-poderia-ser-evitada/ e https://www.youtube.com/watch?v=MiNzetaG5t8 , o material utilizado pela transnacional sueca Skanska na construção da tubulação que leva à caldeira foi de menor qualidade do que deveria ser, na lógica de maximização dos lucros. O entupimento dessa tubulação foi parte das causas do “acidente”.
A redução do efetivo aumenta o risco de acidentes e de doenças relacionadas ao trabalho
Além de indispensáveis melhorias na estrutura física da termelétrica e no esquema de resposta a emergências local e geral da empresa, que cobramos desde antes do acidente e que vamos continuar cobrando, a redução do efetivo da usina aumenta o risco de acidentes. O Sindicato apontou, desde a comissão de investigação do “acidente”, que um dos motivadores do ocorrido foi a excessiva pressão pra produzir energia elétrica no período em questão.
Deixando, na prática, de dar a devida importância aos aspectos físicos de segurança e também prejudicando, em última instância, a situação psicológica dos trabalhadores. Na mais recente reunião da Cipa da UTE-BLS/BF, o Sindicato propôs que seja feita pela empresa uma apresentação das causas do “acidente” e das medidas propostas pra prevenir o mesmo tipo de ocorrido, assim como do que foi feito ao longo desses 8 anos pra que nunca mais uma tragédia dessa suceda.
A Cipa concordou com a proposta. Nessa mesma reunião, foi comentado sobre a placa em memória do Rodrigo Antonio instalada anos atrás na usina a pedido do Sindicato. O comentário ressaltou a importância da placa justamente pra que o colega não se transforme num mero número de estatística e pra nos lembrar todos os dias que devemos nos empenhar pra que todas as medidas necessárias sejam tomadas pra que o que houve com o Rodrigo nunca mais se repita.
Coerente com essa visão, o sindicato tem cobrado há anos que haja pelo menos reposição do efetivo na usina, pois, pelo menos desde 2015, o efetivo local tem sido reduzido. Em 2019, fizemos uma enquete com os operadores da UTE-BLS/BF justamente sobre efetivo.
Considerando a realidade do complexo termelétrico, apresentamos dois cenários, um com o painel da BLS na sala de controle da BF e outro com o painel da BLS de volta na própria usina. No cenário 1, 100% dos operadores que responderam (parte considerável respondeu) opinou que em cada turno deveria ter pelo menos 7 operadores; no cenário 2, mais de 90% opinaram da mesma maneira. O cenário 1, que continua vigente, é visto como mais arriscado, mas, em ambos os cenários, os operadores avaliam que é necessário no mínimo (sublinhamos que é no mínimo) 7 operadores pra que se trabalhe com uma segurança minimamente aceitável.
Diversos operadores comentaram que não é incomum ficarem apenas 2 operadores num turno, o que evidentemente impossibilita algo básico nos manuais de segurança, que é nunca um operador subir sozinho numa caldeira e sem que pelo menos uma dupla tenha na sua retaguarda pelo menos um operador na sala de controle.
A realidade atual é ainda pior, na medida em que o painel da BLS continua na BF e, enquanto antes havia uma equipe pra cada usina, agora é um efetivo só, reduzido, pra ambas. Além disso, como também apontado na enquete e em ofícios enviados pelo Sindicato à usina, a redução do efetivo prejudica até mesmo na análise de riscos pra elaboração de permissões de trabalho (PTs), o que significa um potencial maior de risco de acidente e de doenças relacionadas ao trabalho. O Sindicato continua nessa batalha.
Neste ano, por algumas circunstâncias, a família do Rodrigo Antonio está sentindo ainda mais especialmente a falta física dele e está se mantendo mais reclusa. Por isso, não colocamos aqui a já tradicional mensagem enviada pela família. De qualquer forma, a família agradece a todos os que arregaçam as mangas por segurança e saúde no trabalho.