Retornar ao trabalho presencial é perigoso e irresponsável

Falta de transparência é apenas um dos problemas como a gestão da empresa tem lidado com um possível retorno ao trabalho presencial

Já é comum nas lives da diretoria a pergunta sobre um possível retorno ao trabalho presencial dos petroleiros que estão em teletrabalho emergencial. Os empregados perguntam em suas reuniões de equipe. O Sindicato, desde que o novo presidente assumiu, já enviou dois ofícios em momentos diferentes questionando o desenvolvimento de protocolo para o retorno. As CIPAs têm cobrado a EOR sobre informações nesse sentido. Para toda a preocupação, a resposta da gestão da empresa é a indiferença e a falta de transparência. Sem informações, os trabalhadores continuam apreensivos temendo pela sua saúde e de seus familiares.

A falta de transparência e a negativa em envolver CIPA e Sindicato nessa decisão tão importante para a vida dos trabalhadores é apenas um dos problemas com a forma como a direção da empresa está lidando com esse tema. O Sindipetro-RJ já deixou claro que entende não haver condições para retorno e pediu a postergação do teletrabalho emergencial até dezembro. Aqui listamos alguns motivos para acreditarmos que retornar ao trabalho presencial agora é perigoso e irresponsável:

Falta de negociação coletiva: como dissemos acima, o sindicato já tentou diversas vezes realizar uma negociação para estabelecer o momento e condições seguras para qualquer retorno a trabalho presencial, por entender que o isolamento social é ainda a maior arma contra a contaminação por COVID-19 e portanto qualquer ação que rompa o isolamento precisa ser justificada. A gestão da empresa, no entanto, continua fazendo seus protocolos sem nenhum tipo de negociação coletiva, nem sequer com as CIPAs, ou qualquer critério aparente. O Sindicato solicitou à empresa, nas últimas reuniões de EOR e por ofício, a postergação do teletrabalho emergencial até dezembro com reavaliação entre sindicato e empresa, de forma a permitir um processo com critérios e transparência, o que foi ignorado pela gestão da empresa.

Os casos de COVID-19 não estão controlados: apesar do patamar de novos casos ter reduzido em relação a um passado recente, não é possível dizer que a COVID-19 está controlada no país. Pelo contrário, recentemente há um novo aumento na média móvel de casos, e continuamos no patamar de aproximadamente dois mil mortos por dia no país. Pesquisadores da Fiocruz e de outros institutos já apontam para a possibilidade de uma terceira onda.

Na Petrobrás, já temos 39 óbitos oficialmente reconhecidos entre os concursados. Além destes, são 6.836 casos entre concursados, segundo dados oficiais do MME (boletim de 24 de maio). Só na última semana foram 7 novos óbitos e 117 novos casos. A maioria dos casos é no Rio de Janeiro, como podemos ver pelos boletins obtidos pelo Sindicato por força de liminar e, em números absolutos, na base do Sindipetro-RJ a maioria dos casos são de pessoas lotadas nos prédios administrativos, devido a ter um número muito maior de empregados alocados do que qualquer outra unidade da empresa. Quando esse contingente se encontrar concentrado no mesmo prédio, sem ventilação adequada e compartilhando o mesmo espaço e ferramentas de trabalho, infelizmente o que podemos prever é que os prédios se tornarão líderes incontestáveis também em números relativos, com o tamanho colossal de um surto de COVID-19 nessas condições. Isso sem contar os terceirizados, que estão morrendo e se expondo como os concursados e não estão nas estatísticas colocadas acima.

Não há vacinação em massa: 20% da população brasileira recebeu pelo menos uma dose da vacina, e 10% recebeu as duas doses. No entanto, em sua maioria as pessoas que receberam as vacinas são pessoas idosas e da área de saúde – os trabalhadores industriais não estão sequer como grupo prioritário no Rio de Janeiro, por exemplo. Segundo registrado no PCMSO de 2020, mais da metade dos empregados usuários do EDISEN, por exemplo, possui menos de 45 anos. Ou seja, uma faixa etária que ainda não tem perspectiva de vacinação, que possui filhos em idade escolar, que provavelmente possui pais idosos, por quem tem sido responsáveis nessa pandemia. Logo, o retorno dessas pessoas ao trabalho coloca em risco não apenas o empregado como toda sua família.

Qualidade do ar: durante o período parado, evidentemente os prédios não funcionaram com o ar condicionado em sua plena capacidade. Portanto, um retorno sem o devido cuidado pode colocar os trabalhadores em perigo não só de COVID-19, mas de outras doenças transmitidas pelo ar. No edifício Senado, por exemplo, recente relatório recebido pela CIPA mostra que a qualidade do ar é inadequada. O problema de mofo já existia anteriormente e certamente já se proliferou para outros andares em função da diferença de temperatura e umidade causadas pelo funcionamento parcial do sistema. Junte-se a isso, o fato de que o ar condicionado está localizado no chão, o que aumenta o risco de contaminação já que a saída do ar condicionado mantém os contaminantes permanentemente em suspensão no ar.

Além disso, como os prédios da empresa não têm a possibilidade de abrir as janelas, não tem como garantir uma taxa de renovação de ar adequada. Enquanto a gestão da empresa desenvolve sua política negacionista, a OMS reconhece cada vez mais o perigo da contaminação pelo ar (veja uma matéria sobre o assunto). O problema não se restringe somente ao local de trabalho: os elevadores, que já eram utilizados com grande frequência e que, no horário de almoço funcionavam sempre na capacidade máxima, só poderão transportar 4 pessoas por viagem. Desta forma, será necessário um número maior de “viagens” para transportar a todos. E onde essas pessoas irão aguardar? Se aglomerando no hall? O sistema de elevadores tem condições seguras de funcionar com essa intensidade de demanda?

Smart office: durante o teletrabalho, a gestão da empresa realizou mudanças no leiaute das áreas administrativas, com o objetivo de reduzir os espaços entre as estações de trabalho e de suas dimensões. Além disso, o número de estações é inferior ao número de usuários, já que o conceito de Smart Office foi criado incluindo o teletrabalho por alguns dias na semana. Além de aumentar a proximidade entre as pessoas, será necessário o compartilhamento das estações de trabalho. Essa troca poderá ocorrer várias vezes por dia, já que não haverá mais locais “marcados”. Ou seja, aglomeração e compartilhamento de ferramentas de trabalho, tudo o que é condenável em tempos de COVID-19. Não só isso, mas não há nenhuma evidência de que a direção da empresa adotará medidas básicas como a separação de estações de trabalho com telas de acrílico, aumento na frequência de limpeza, entre outros. Sem poder “desreformar” o prédio, sem indícios de que se importe com a saúde dos petroleiros, um retorno forçará os trabalhadores a adotarem condições inseguras de trabalho.

Contratos de serviços: durante a pandemia houve grande redução de trabalhadores terceirizados, desde recepcionistas e seguranças, passando pelos garçons e copeiras, além de trabalhadores da limpeza. Desta forma, haverá alguma garantia de a limpeza nos ambientes de trabalho, nas copas, nos refeitórios e sanitários será feito com a frequência e intensidade necessários?

Deslocamento casa-trabalho: como dissemos anteriormente, a COVID-19 ainda está longe de estar controlada. Um retorno ao trabalho presencial fará as pessoas se deslocarem primeiro para o Rio de Janeiro, no caso dos que moram fora. Depois, deslocar-se da casa para o trabalho todo dia. Junte-se a isso o fato de que grande parte das empresas de ônibus reduziram e, até mesmo, extinguiram, algumas linhas de ônibus, levando os trabalhadores a se aglomerar nos veículos e nos demais meios de transporte coletivo. Isso evidentemente expõe os trabalhadores, já que a maioria precisará utilizar o transporte público, portanto se sujeitando a aglomerações.

Lotação do refeitório: com a falência de restaurantes no entorno e o perigo de contaminação, a maioria dos trabalhadores provavelmente optará por fazer suas refeições no prédio. E aí as copas, que já eram bastante lotadas antes, ficarão ainda mais cheias, visto que os equipamentos de microondas irão falhar com mais frequência e o número de ocupantes do prédio é maior do que em 2020, já que o EDISEN e o EDISE receberam trabalhadores do Ventura, Edicin, EDIHB… Ainda tem a questão das copas, que são praticamente salas com mesinhas (ou seja, sem a estrutura de um refeitório de unidade operacional) com milhares de trabalhadores tentando de alimentar aproximadamente do mesmo horário em um local pequeno e fechado. É a receita para uma tragédia.

A Petrobrás já retornou as pessoas que trabalhavam essencialmente de forma presencial: desde o início da pandemia, a gestão da empresa manteve o funcionamento de plataformas, refinarias, terminais, todas as unidades operacionais e até algumas não operacionais, como o Comperj (hoje chamado de Gaslub), plataformas que estavam em comissionamento, etc. E os sindicatos tem recebidos muitas denúncias de surtos por parte dos trabalhadores. Portanto, chama a atenção a completa irresponsabilidade de expor desnecessariamente, em plena pandemia, um contingente de trabalhadores que pode exercer suas funções em teletrabalho, como tem feito nos últimos 14 meses em que a empresa bateu recordes de produção, teve um lucro expressivo, etc.

Um retorno neste momento e nestas condições, colocará toda a força de trabalho sob o risco de contaminação iminente.

Nós lutamos contra a gestão da empresa para reduzir o contingente em trabalho presencial, e denunciamos em diversos momentos a omissão da direção da empresa com as medidas sanitárias, o que já custou vidas ao longo destes meses de pandemia. As unidades presenciais viveram diversos surtos de COVID-19, as plataformas do Sindipetro-RJ mesmo são exemplos disso – infelizmente não é incomum que se passem dias seguidos com uma mesma base (com contingente menor do que o de um prédio administrativo como o EDISE ou EDISEN) informando 4, 5 casos confirmados por dia, como podemos ver nos relatórios recebidos pelo sindicato por força de liminar. E, se já há tanta omissão nas medidas sanitárias com um contingente relativamente reduzido, a tendência é piorar ainda mais conforme a quantidade de empregados em trabalho presencial aumenta exponencialmente com um retorno nos prédios administrativos.

Contra a irresponsabilidade, o Sindicato exige a postergação do teletrabalho presencial até dezembro com reavaliação da empresa com o sindicato. Não à política de morte!

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